terça-feira, 30 de novembro de 2010

Plin-Plin

Há um semana, eu via vovó pela última vez. Ela já não estava mais entre nós. Sabendo que eu estava longe, deu um sinal de vida lá no céu, só pra mim. Primeiro, uma piscadela rápido em meio ao aspecto rubro do céu, que talvez já soubesse da notícia bem antes de mim. Implorei para que ela voltasse, e assim fez, como uma estrela solitária reluzindo lá do alto. Me tirou um sorriso do rosto envolto de lágrimas.
Entendi como um sinal de que estaria indo para um lugar melhor, um alento, seu merecido descanso...
Era chamada de vó por vários vizinhos, até da rua detrás.

Vovó foi uma guerreira. Mãe de vários filhos, quase uma dezena, criou todos e seus netos com o mesmo grande amor e carinho. Morei com ela até meus dez anos de idade. Ouvi muita bronca. Vovó, de tão doce, não transmitia na hora do sermão a imponência necessária para nos medrar, e eu, criança, pintava e bordava.
Lembro de uma história de que certo dia ela me levou pra passear no colo, eu ainda bebê, e há uns 20 metros longe de casa, me deixou cair numa poça d'água de cara no chão.

Lembro também, perfeitamente, do som que emitia em sua risada breve. Sua voz baixa e pequena estatura podiam enganar pela fortaleza que era por dentro.
Tenho toda a certeza de que até o último suspiro de sua vida, cuidou do vovô como sempre cuidou desde quando, ou até antes, de ele se tornar um enfermo de cama.

Católica assídua, fazia questão de ir à missa todos os sábados a noite, na maioria deles, sozinha. Rezava o terço toda noite antes de se deitar.

Apesar de sustentar um dente apenas, seu sorriso era fácil, sincero, sem vergonha, acolhedor.
Sempre me pergunto por que vovó se foi, as eu não consigo encontrar resposta plausível.

Às vezes me conforto no pensamento de que era melhor assim, pois a angústia que deveria estar acumulada em seu coração por atitudes irracionais e acontecimentos a bem pouco tempo atrás, era imensurável.
Outras vezes a revolta toma conta de mim. Passo os dias esperando um ano novo, para que tudo se renove.

Hoje as lembranças de vovó são apenas alegres, apesar da dor das lágrimas. Porém, isso tende a me deixar mais forte, e agora verei a outra vovó, agora a única que me resta, sempre com uma pitada de Esmeralda, que se foi, mas deixou seu brilho em todos os corações.




PS: Se quisesse, saberia mas não fiz questão: não sei a data que vovó morreu. Só sei o dia. Foi na madrugada de quarta pra quinta que eu recebi a notícia, e dolorosamente tive que repassá-la para os que estavam ao meu redor. Tenho quase certeza que foi na quarta;

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